sexta-feira, 12 de dezembro de 2014 4 comentários

Uma tatuagem e um cigarro.



"Talvez esta tenha sido a coisa mais ingénua e inocente que fiz até hoje."... eram as palavras que nasciam nas folhas brancas do seu diário cor-de-rosa enquanto fumava o seu habitual cigarro do dia. Matilde tatuou o seu corpo pela primeira vez aos 16 anos, num dia em que encheu os seus pequenos pulmões de menina de rebeldia e soprou contra a vontade dos pais. Nunca foi fácil para Matilde ir contra a "tradicional" vontade imposta pela sua família, sentindo-se por vezes à parte, como se a sua família não fosse verdadeiramente dela, como se tivesse sido adoptada por estranhos com um mapa de vida todo planeada... e Matilde não encaixava, nunca encaixou em momento algum da sua infância naqueles planos. Ela era diferente daqueles dois seres... queria mais, queria viver mais, queria arriscar mais, queria viver a sua vida com direito a tudo de bom e de mau, queria sentir o mundo a seus pés pela sua própria conta. A sua primeira tatuagem representava mais do que um simples símbolo da sua juventude carregada de rebeldia, era o início de algo, o princípio do desejo de querer assumir as rédeas da sua vida e de marcar a diferença. Passados 7 anos, Matilde tem agora mais duas tatuagens espalhadas pelo corpo. Para ela, representam sinais de esperança, mensagens codificadas que só ela entende, planos de vida forjados na pele... um começo de tudo. Matilde é louca pela vida, mas sempre teve medo de a viver. Talvez pela educação que recebeu, pelo apoio que nunca teve na infância, pela família "estranha" que a acolheu... Matilde ainda consegue sentir a mão do seu pai na sua face pelas duas chapadas que recebeu daquele dia. A sua pele tatuada ainda dói com a amargura do carinho que nunca recebeu. O que significa para vocês ter uma tatuagem? Serão as tatuagens formas de comunicação do nosso interior?
quinta-feira, 11 de dezembro de 2014 2 comentários

Uma recordação e um cigarro.




"És tudo o que me resta..." - estas eram as palavras silenciosas que se esfumavam dos seus lábios sempre que fumava o seu único e habitual cigarro. Para Matilde, fumar não representava um vício, não se tratava de um vício qualquer, mas sim de uma forma de relembrar como a vida pode ser tão escassa quanto um simples cigarro. Começou a dar os seus primeiros bafos na noite seguinte após o funeral do seu irmão e já lá vão dois anos. - Fumar mata - é a mensagem que cada maço quer transmitir antes e depois de ser violado 20 vezes num dia, numa semana ou num mês, mas a vida também mata quem nunca fumou. E o seu irmão morreu sem nunca ter fumado! Matilde detesta fumar, não suporta o odor que inala, não aguenta a chapada agressiva do fumo branco perfumado, a morte lenta vindo directamente dos seus pulmões para seus olhos verdes cor de esmeralda. E no fim, sempre chora quando está sozinha. Fumar, para Matilde, é reviver o passado. É também uma fonte de esperança... porque a vida talvez seja só dois dias, e a dor no segundo dia pode sarar. A dor só é de alguém quando se ama outro alguém e Matilde amava para lá das estrelas o seu irmão. A verdade é que a Matilde é filha única e o seu irmão nasceu de uma simples amizade de escola. "És tudo o que me resta..." - afinal, a vida já fascinou e dominou Matilde assim como também já a matou. Quem nunca escondeu os seus pecados no vício curto do cigarro? Quem não fuma para recordar? Quem?
sexta-feira, 5 de dezembro de 2014 0 comentários

Uma carta e um cigarro.



Se falar de amor não é fácil, para a Matilde torna-se uma tarefa quase impossível. Porque o amor é tudo e não é nada. "O amor é..." - escrevia Matilde na sua carta enquanto fumava o seu habitual cigarro. "...oxigénio, mas também pode ser um tampão para os meus pulmões. Posso morrer de amor, mesmo que não seja fácil amar-te. Posso esquecer-me do limite do sofrimento, mas não posso escolher deixar a vida passar por mim sem te amar. Amar é outra coisa. E o meu amor por ti é como uma fénix, nasce e renasce das cinzas até voltares do nada e incendiares-me toda por dentro com um simples "olá". Já tentei ficar bem depois de te ver partir, e depois do depois, quando já nem te sinto em mim novamente, pergunto-me, o que ficou no lugar do nosso amor? Porque amor é outra coisa e nós fomos qualquer coisa numa terra de estranhos que não sabem amar. E hoje, escrevo para ti, escrevo para que possamos os dois aprender a conjugar o verbo desistir. Por favor, ajuda-me. Eu não te quero mais na minha vida. Aceita as minhas palavras e salta do meu coração em andamento como se de um comboio expresso se tratasse, e por favor, não te magoes tanto como eu. Deixa-me partir e tentar como se fosse possível, terminar o puzzle do meu coração sem ti com peças de outras pessoas. Por fim, aceita que a nossa história de amor tinha de terminar, não por falta de sorte ou falta de amor. Simplesmente tinha de terminar... o meu amor por ti será sempre outra coisa. A vida sem ti será sempre outra coisa e esta carta de cor branca e letras tão macias não é uma despedida, é outra coisa..."
P.s: Amar só se ama uma vez.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014 0 comentários

Uma escolha e um cigarro.



"Sigo o meu caminho como se não pudesse mudar de rota."... esta foi a última publicação que Matilde tinha visto momentos antes de desligar a sua sessão do instagram e voltar ao estudo intensivo para a frequência de odontologia que iria ter na próxima semana. Por vezes, Matilde sentia-se tão perdida e afundada entre tantos livros de autores experts nos assuntos, apontamentos todos bonitos, fotocópias e pesquisas na internet... havia tanto para decorar e tão pouco tempo para o conseguir fazer. Estivesse ela na biblioteca da escola ou na secretária do seu quarto alugado, tudo lhe lembraria uma ilha deserta onde os barcos avistados não passavam de meras ilusões de salvamento. "O pior já passou..." - dizia ela para si, depois de ter concluído com êxito o seu primeiro ano da licenciatura e de ter concorrido, no segundo ano, a uma bolsa de Erasmus para Praga, capital da República Checa, com a necessidade emergente de se poder libertar momentaneamente de todas as escolhas que os pais lhe tinham impingido a vida toda. Ou não viesse Matilde de uma família bem estruturada, com um bom estatuto social e uma excelente carreira ao nível da medicina. Desde pequena que sempre ouvira dos seus pais: "Matilde, um dia serás uma médica de sucesso como o pai...", "Matilde, tens de te aplicar para conseguires entrar na faculdade de medicina..." ou então "Quando fores médica, os pais vão ter muito orgulho em ti...", frases que ecoam na sua mente até aos dias de hoje. Matilde sentia-se sem controlo do seu próprio destino, todas as escolhas que haviam para fazer, já tinham sido feitas por terceiros completamente equivocados sobre os seus interesses e desejos. Aquela frase que lera no instagram assentava que nem uma luva à descrição da sua jovem vida... tudo o que ela precisava era de um único cigarro para esquecer a terrível sina que era viver um caminho que não era o dela, e este era um dos piores castigos que a vida lhe dava. Será que os pais de Matilde queriam mesmo o melhor para ela? Será que os pais sabem mesmo o que é melhor para nós?
terça-feira, 2 de dezembro de 2014 1 comentários

Um comboio e um cigarro.



"A vida transforma-se numa estação de comboios e o vento anuncia-nos a chegada antes do alcance do olhar."... terminava assim Matilde de ler mais um capítulo do seu novo livro, momentos antes de apanhar pela sua primeira vez na vida um comboio com destino marcado para Lisboa. A noite já tinha tropeçado no Sol e poucos eram os passageiros que em terra esperavam como Matilde pela hora prometida. A sua ansiedade era tremenda, Matilde sentia naquele momento um nervoso miudinho a percorrer-lhe todo o corpo e um autêntico formigueiro nos pés, fazendo com que não parasse quieta um segundo de um lado para o outro no meio da estação, olhando constantemente para o negrume da noite na esperança de ver o brilho de uma luz diferente das outras. Com um casaco verde comprido até ao joelho, um carapuço cheio de pêlo polar a proteger-lhe a cabeça do frio, uma malha em tons de creme que a aconchegavam por dentro, umas calças de ganga e uma mochila às costas, Matilde sentia-se mais do que preparada para enfrentar o frio daquele noite de Inverno e os seus novos desafios profissionais que a esperavam do outro lado da linha. Lisboa, tinha-lhe sido prometida após deixar para trás família e amigos. Depois da tão insofrida espera ter terminado, Matilde como rapariga prática que era, colocava logo em acção o seu terrível hábito rotineiro de querer escolher um lugar junto à janela, esquecendo-se de todo o nervosismo que até então a tinha consumido. A única companhia que tinha do outro lado daquela janela de ecrã escuro eram as luzes das casas, das ruas, que à distância assemelhavam-se a promessas falhadas por quem nunca tinha lutado pelos seus sonhos, ficando à margem da cidade prometida... Matilde queria mais, queria pertencer à cidade das luzes, da agitação, das filas de espera, das pessoas... das promessas. E durante mais de metade do tempo da sua viagem, Matilde entreteve-se a desenhar no seu tão adorado bloco cor-de-rosa de folhas brancas, enquanto esperava ansiosamente por fumar o seu primeiro cigarro naquela que seria a sua primeira estação prometida que os ventos anunciavam para lá do alcance do seu olhar. Será que o nosso destino é uma eterna promessa? Devemos nós sair da nossa zona de conforto e agarrar o "inagarrável"?
segunda-feira, 1 de dezembro de 2014 1 comentários

Um amigo e um cigarro.



"Tenho de aprender a respirar o ar que já não partilhamos."... dizia ela para o seu jovem coração já mastigado com a fervura da juventude, depois de terminar a leitura de mais um capítulo do seu novo livro. Para Matilde, ler é como estar apaixonada, é sentir borboletas na ponta dos seus dedos até ao mar verde esmeralda dos seus olhos, é encontrar um novo mundo e refugiar-se nele. Matilde nunca tivera a noção das horas que depositava em cada viagem, de capítulo em capítulo, de livro em livro até voltar a se encontrar novamente em si. Em todas as viagens que seguia, depois de apanhar a sua boleia na mesa de cabeceira com destino marcado à cama ou ao seu sofá da sala. Matilde sempre perdia meio segundo para tentar encontrar os seus tão bem feitinhos óculos que lha davam um ar de intelectual, feitos com a massa mais fina e leve, de cor branca, que lhe assentavam que nem uma luva. Com um rosto de princesa, os lábios mais bem desenhados que deus alguma vez fizera, com um pequeno sinal entre o seu nariz e o lábio, uma pele de invejar o toque das pétalas de uma rosa, Matilde possuía todas as características de um anjo descido à terra. Era impossível passar por ela na rua e não lhe ficar indiferente... e mesmo assim, ele partira e ela tivera de voltar a aprender a respirar o velho ar. Como sempre, no fim de cada alucinante e apaixonante viagem, um cinzeiro e um único cigarro a esperavam na estação para lhe dar as boas vindas. O fumo branco que lhe saia por entre os lábios e narinas tornava-se a sua única consolação, após mais uma viagem que a deixou sozinha em terra. Será que também adoram viajar como a Matilde o faz? Será um simples livro capaz de se tornar o nosso melhor amigo?

sábado, 29 de novembro de 2014 0 comentários

Um filme e um cigarro.



"I don't want to be young but I don't want to die I can whisper in the wind we can smoke out every night..." Matilde, desde que se lembra, sempre foi uma viciada do pior em filmes de romance, drama e comédia. Para ela, encontrar estas três categorias reunidas em um só filme tornavam-no logo à partida num filme "top" ou de eleição na sua cabeça. Sempre que assistia a um filme no seu tão adorado e leve computador de cor cinza prata, perdida entre mantas e almofadas com bordados de flores da sua cama, Matilde tinha a terrível mania de se envolver com qualquer história de filme e vivê-la como sua, sentindo ao pormenor tudo o que as personagens encenavam do outro lado do ecrã. E afinal, quem nunca sentiu essa sensação de querer invadir uma história de filme e torná-la sua? Questionava-se ela depois de cada sessão de cinema ao dirigir-se para a sua varanda do sétimo andar. Enrolada numa das mantas axadrezadas de cor creme, vermelha e preta que tinha, com os seus pés de princesa descalços, um cigarro seguro nos dedos da mão direita e uma chávena de café presa à sua mão esquerda com unhas ainda por pintar, uma combinação quase perfeita para quem desejava fitar o horizonte com a ideia que a sua vida daria um filme quase tão igual àquele que assistira no conforto do seu quarto despido por quatro paredes brancas. Matilde sempre amou a sensação de poder percorrer toda a sua casa com os seus pés descalços e sentir a frescura dos tacos de madeira do chão que a faziam sentir-se livre. Estes sempre foram alguns dos pequenos prazeres que Matilde retirava da sua vida, porque nunca se sabe o quão rápido tudo pode terminar até acontecer. E a vida é feita de momentos, tal e qual como um filme.
quarta-feira, 26 de novembro de 2014 0 comentários

Um gira-discos e um cigarro.



"People are strange when you're a stranger faces look ugly when you're alone... When you're strange, no one remembers your name..." susurrava já Matilde por entre os seus dentes muito antes de colocar a agulha do gira-discos sobre uma cópia quase perfeita de vinil dos The Doors, uma herança que recebeu do seu avô. Como qualquer um de nós, Matilde também sofria com a depressão dos aclamados "dias cinzentos", transfigurando qualquer lugar, qualquer hora, qualquer rosto num imperfeito perfeito desconhecido. As quatro paredes de cor branca tal como a porta, delimitavam a fronteira de segurança imposta pelo seus pensamentos e medos. O único pormenor que ressaltava à vista de quem invadisse o seu refúgio seria um pequeno quadro pintado à mão, afixado por cima da sua cama. O desenho era de um cavalo pintando a dois tons, de branco e azul. Um cavalo de príncipes e princesas que sobrevoava os seus sonhos e os sonhos de quem um dia já pertenceu ao seu mundo. Uma lembrança única para quem era convidado a entrar. Em certos dias como este, Matilde sentia-se uma estranha por completo dentro de si mesma, querendo destruir todas as lembranças de promessas feitas, todos os sonhos desenhados e arquitectados na perfeição pela sua cabeça... querendo apenas fugir das responsabilidades impostas pela sua idade e coração. Um cigarro é tudo o que ela precisa, apenas um cigarro para esquecer. Matilde tem por hábito lançar ao ar a seguinte frase: "é tão difícil ser eu" e por vezes ou muitas das vezes, desejamos tanto mas tanto ser outro alguém. O que deverá fazer Matilde para ultrapassar os seus "dias cinzentos"? Será que os nossos medos são mais fortes que os nossos sonhos? O que diriam a Matilde?

terça-feira, 25 de novembro de 2014 2 comentários

Um desabafo e um cigarro.



"I'm in love with you and you will never know but if I can't have you I'll walk this life alone spare you the rising storms and let the river flow..." esta é sem dúvida uma das melhores frases musicais para definir o seu coração. Para Matilde, falar de amor não é fácil. Na maioria das vezes, prefere fumar um único cigarro e colocar um ponto final sobre o assunto. No seu entender, fumar é nada mais nada menos que respirar o fumo branco para alcatroar os seus pulmões e coração deixando-o pálido de sentimentos que não consegue controlar. Ela nunca foi rapariga de exigir muito, queria somente um pouco de amor de quem optou por amar outra pessoa, deixando bem claro na sua cabeça que nem sempre só amar chega. Por vezes, é preciso um pouco mais. No mais íntimo do seu interior, Matilde sabe com todas as suas certezas de mulher apaixonada que já encontrou a sua alma gémea e que esta não lhe está destinada a permanecer do seu lado. Tornou-se mais fácil alimentar o seu vício animalesco em nicotina do que voltar a ler nas estrelas a promessa de encontrar um novo caminho para dentro da tempestade que é o amor. E apesar de tudo, são os casos fugazes e pontuais que marcam e alimentam os últimos anos de vida de Matilde, abraçando pequenos restos de amor aqui e acolá. Será que Matilde deverá somente aceitar o amor que acha que merece? Ou deverá ela abrir mão do seu único amor e tentar ser feliz?
segunda-feira, 24 de novembro de 2014 3 comentários

Um autocarro e um cigarro.



"The truth is I'm better on my own and I don't want to live in the past..." esta foi a primeira frase que chegou aos ouvidos de Matilde pouco depois de se sentar no lugar que escolhera para aquela viagem. E sempre que viaja em transportes públicos coloca em prática o seu terrível hábito rotineiro de escolher um lugar ao fundo, perto da janela para que os seus olhos cor de esmeralda se possam perder em todos os rostos estranhos da rua e os seus edifícios. Para Matilde, aquela viagem de autocarro representa os seus quinze minutos de prazer, na qual se desliga do resto do mundo e se afunda em si, depois de mais um dia de Inverno no qual o Sol resolveu brilhar. A música que passa na rádio, as vozes distorcidas dos estranhos que a acompanham, os sons lá de fora são tudo o que ela precisa para relaxar e pensar em si. Afinal, o mesmo acontece com qualquer um depois de pressionar o botão "play" do seu MP3 ou Ipod e colocar os seus "phones" nos ouvidos. Matilde, ao contrário dos outros adolescentes da sua idade, prefere o som da vida, da rotina, do autocarro. E o lugar que escolhera para a viagem daquele dia não era o mais reconfortante, mas era o que melhor visão oferecia do lá de fora. Matilde, por vezes, questiona-se sobre o significado do termo rotina. O que deverá fazer Matilde, manter uma rotina estável e segura? Ou quebrar as regras do jogo e desafiar o destino, o imprevisível?
sábado, 22 de novembro de 2014 0 comentários

Uma cama e um cigarro.



"Que saudade eu tenho daquelas noites de Verão, havia sempre solução para nós... havia..." ouvia ela através do seu smartphone aconchegado na mesa de cabeceira ao lado da cama que reproduzia um dos últimos álbuns da sua banda preferida, os Expensive Soul, enquanto que sentada aos pés da sua cama, matava o seu último cigarro daquela noite. A música penetrava-lhe os poros assim como o frio do inverno teimava em invadir o seu quarto e congelar os seus pensamentos. Ela odiava o Inverno e tudo o que lhe fizesse lembrar dele. Todas as noites, antes de ir dormir, Matilde tinha o terrível hábito de se deitar por cima da cama enquanto que os seus olhos verdes cor de esmeralda reflectiam o vazio do tecto do seu quarto no qual construía os planos para o próximo dia, para toda a semana. O que Matilde nunca aprendera era que a vida encarregava-se sempre de lhe estragar os planos, porque tanto a vida como o tempo não são bens adquiridos como ela pensava. Será que Matilde deverá continuar a construir planos para a sua vida? Ou deverá ela viver o momento?
quinta-feira, 13 de novembro de 2014 0 comentários

Uma janela e um cigarro.


"De vez em quando precisavas de voltar a ti, relembrar-te, visitar-te."... dizia ela a si própria enquanto queimava e inalava as suas últimas lembranças amorosas falhadas a meio de cada cigarro pela manhã. O fumo branco batia-lhe no rosto como perfume de lágrimas secas, consumidas pelo vício animalesco que tinha em nicotina, enquanto que o seu olhar esverdeado esbatia as sombras dos outros prédios à sua volta. Deslumbrava-se com pouco e todos os dias antes de ir tomar o seu duche, entretinha-se a olhar para a vida lá fora, sentada no chão de madeira do seu quarto, saboreando a forma como recebia aquela aragem fria que lhe batia sobre os seus pés de princesa, vinda da janela de madeira pintada de branco, constituída por oito vidros rectangulares que a separavam do resto do mundo. A vida dos outros quase sempre lhe parecera mais interessante que a sua, fitava-os com o olhar do topo do seu apartamento e imaginava na sua cabeça como seria bom largar tudo o que tinha para viver a vida de outro alguém... estes sempre foram os pensamentos que acompanhavam Matilde antes de cada dia de trabalho.Será que se pudesse, Matilde trocaria toda a sua vida por outra? Será a vida dos outros melhor que a sua?
 
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